"Os Banshees de Inisherin" é o filme mais triste do Oscar
E um bait enorme pra academia, mas já chego nisso...
Se você estiver lendo essa newsletter na semana de publicação, é bem provável que "Os Banshees de Inisherin" ainda esteja em exibição em algum cinema de centro de cidade aí por perto. Embora tenha sido lançado há meses nos EUA, esse é um daqueles “filmes de Oscar” que as distribuidoras por aqui guardam para soltar nessa época próxima à premiação.
O que faz sentido, já que “Os Banshees de Inisherin” é 100% o tipo de candidato que a academia costuma abraçar. Mas já chego nisso.
Antes vale mencionar que “Banshees” é um negócio triste demais. De um jeito até covarde. E talvez esse seja o seu grande problema.
Na trama, Colin Farrell (o Pinguim do “The Batman”) encarna Pádraic, um cara que, de uma hora pra outra, precisa lidar com o fato de que seu melhor amigo, Colm (Brendan Gleeson), não quer mais sua amizade. A dupla mora em um vilarejo isolado na ilha fictícia de Inisherin, na Irlanda dos anos 1920 (época onde o país passava por uma guerra civil). Não há muito o que fazer no local, então os dois, diariamente, se encontram às 14h para beber em um pub.
Porém, um dia, o Colm decide que quer distância do companheiro. O motivo? Deve ser spoiler, então não vou estragar a surpresa, mas o filme deixa no ar o porquê dele ter chegado nessa conclusão. Depressão? Loucura? Ou um acesso de razão? No fim, tanto faz.
Só que as coisas escalam de maneira violenta (no sentido físico e psicológico) quando o Pádraic se recusa a deixar a amizade morrer. Ambos mergulham numa espiral autodepreciativa e cruel, que é acompanhada pelos demais moradores da ilha, parte com preocupação (principalmente pela irmã de Pádraic, Siobhán, vivida por Kerry Condon), parte quase como um entretenimento sádico pelo policial e pela “bruxa” da ilha.
Em paralelo, corre também a história trágica do jovem esquisitão Dominic (Barry Keoghan, o Coringa do “The Batman”). Filho do policial do vilarejo, ele é evitado por todos, já que teima em perturbar qualquer um que chegue perto. Ao ver a amizade da dupla ruir, Dominic parece encontrar ali a oportunidade de substituir Colm na vida de Pádraic.
Adiei assistir “Banshees” por bastante tempo. Pois não gosto do Martin McDonagh como diretor e, principalmente, como roteirista. “Na Mira do Chefe” (2008), outro longa seu encabeçado por Farrell e Gleeson, é divertido. Mas o celebrado “Três Anúncios Para Um Crime” (2017) deve ter sido um dos piores filmes que assisti na vida (a cena com o Sam Rockwell não percebendo que o lugar está pegando fogo pois está usando fones de ouvido é inaceitável).
Talvez eu devesse ter continuado adiando. Porque isso aqui é triste demais. E não de um jeito tocante, em que acreditemos que aquela sequência de acontecimentos, realmente, seria possível na vida real. O roteiro soa apelativo ao empilhar um desfecho ruim atrás de outro. O filme é descrito como uma “tragicomédia”, mas ele seria melhor definido como um dramalhão sensacionalista, tantos são os momentos em que o vinagre é forçado.
Começa com a amizade deixada de lado, mas seguem cenas onde o personagem de Farrell vê o ex-amigo se divertindo com outros, outras com falas mais ácidas de moradores da ilha, há uma dele apanhando do policial justamente no momento em que Colm está se aproximando, segmentos com mutilações, até mortes de animais. Tudo parece montado para nos compadecermos (em lágrimas) da dor de Pádraic. Delicadeza zero.
Piora ao percebermos que 90% dos coadjuvantes são figuras de cartolina unidimensionais. O dono do bar é o dono do bar, o policial canalha é o policial canalha, a fofoqueira da venda é a fofoqueira da venda (literalmente há uma cena dela abrindo uma carta para saber o conteúdo), a “bruxa da ilha” é a “bruxa da ilha”. A única exceção é a irmã de Pádraic, para a qual Kerry Condon consegue dar matizes sobre uma mulher que quer algo mais da vida, mas ainda se preocupa em deixar para trás seu irmão.
“Os Banshees de Inisherin” é um desses filmes que pegam na mão e nos forçam pra um lado (no caso, tristeza e pena). Ele é zero sutil e não permite que o espectador elabore suas próprias interpretações ao terminá-lo.
Talvez por isso tenha sido tão abraçado pelo Oscar: nove indicações, incluindo Melhor Filme (!), Melhor Direção (!!), Melhor Ator Principal (Farrell), Ator Coadjuvante (Gleeson e Barry Keoghan), Atriz Coadjuvante (Kerry Condon) e Roteiro Original (!!!). Capaz de ganhar Melhor Filme só para a academia não premiar uma ficção-científica em “Tudo Em Todo Lugar Ao Mesmo Tempo”.
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